Esse é velhotinho e estava perdido no meio dos meus alfarrábios, mas me deu saudade dele.
Fui ajeitar o travesseiro como sempre, alisando o tecido e tirando os cabelos soltos quando dei de cara com aquilo.
Aquilo não me pertencia.
Aquele não era meu cabelo.
Era um maldito fio de cabelo negro.
Uma maldita mini lembrança daquela noite. Daquela maldita noite em que ele estragou tudo, tudo.
Eu só queria entender por que é que ele teve a idéia de trazer vinho. O melhor vinho do meu ano. Nem me liguei que era um tinto numa noite quente.
Mandei pastar a bagunça da casa. Liguei o som, fiz um ar casual. Escondi todos os vestígios do tufão que fui pondo tudo dum jeito minimamente apresentável. Tirei o lixo, escondi roupas, escovei os dentes. Eu sabia que ele nem se importava com meus óculos, mas troquei pelas lentes do mesmo jeito.
Aí ele chegou com aquele vinho e aquele sorriso. E aquela cara, querendo apanhar num relance todas as minhas coisas, toda a minha casa, tudo que era meu. Me aprendendo em cinco segundos. Me tomando no colo, dando um jeito no som, dominando o terreno.
Abrindo o vinho.
Impressionando com o pequeno ritualzinho de degustação - um belo vinho.
E largando a taça em menos de dez minutos, e me tomando, e me levando, e fechando janelas, e ligando ventiladores, e perguntando o que diabos Dom Pedro II, em barbas e capa de revista, estava fazendo na minha cama. Nem respondi.
Aí ele ficou ali, fazendo nada comigo, ouvindo o ventilador e vendo a cortina esvoaçar enquanto eu mexia nos cabelos dele e passava meus dedos bem de leve nas costas. No torso, na coluna, medindo cada centímetro daquela pele tão perto da minha.
Aí ele continuou o desastre. Virou de leve e disse "ai que carinho bom. Era isso que eu precisava. De alguém pra dormir comigo". E não me largou nas seis horas seguintes.
Eu sei porque não dormi. Preocupada. Porque ele disse que não ia ficar. Pensando, pensando, pensando... como sempre. Eu devia era aprender a parar de pensar, desligar as máquinas. Eu devia era ter só ficado ouvindo a respiração dele ali do meu lado, agarrado na minha mão como se fosse o último ursinho do mundo.
Por que?
Por que ele não esperou mais meio segundo de desdém quando eu disse que estava ficando com frio pra puxar a coberta?
Por que foi que ele acordou e me olhou com a cara mais calma do mundo, e disse "bom dia" como se fosse o décimo nono dia?
Por que foi que ele tornou aquela noite uma noite de paz e de sossego? Por que foi que aquele dia começou como se fosse um BOM dia?
Não era um bom dia. Era só mais um dia começando com um cara na minha cama, cacete. Mas o cara era doce. E deixou lá em casa meia garrafa de vinho e uns fios de cabelo...
domingo, 13 de abril de 2008
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2 comentários:
xiiiii
e a vida dá mais uma volta da maldita espiral...
aff lu....q lindoooooooo , escrito assim fica lindo hehehe e sentido tb vai...ai ai ...
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